Quando ela o conheceu, ele era apenas um garotinho, não mais do que seis ou talvez sete anos. Ele brincava de um lado para o outro, ria de tudo o que via e sorria para qualquer um que passasse. Embora ela também tivesse apenas seis anos, se lembrava com a maior facilidade daquele dia. Não que fosse um dia importante ou alguma data específica... Lembrava-se porque foi a primeira vez que falou com ele. Ele corria atrás de um gatinho na rua, enquanto ela por sua vez, continuava lá, parada... Examinando aquele estranho menino. Os cabelos negros dele eram como o ébano e seus olhos, ela poderia jurar que eram um tipo de portal para alguma dimensão distante daquela. E o que dizer do sorriso? Ah... Era perfeito! Ele ria sem medo e divertia-se com o que, aos olhos do mundo, era algo tão banal. Ele aproximou-se dela segurando o gatinho em seus braços e apenas disse com a simplicidade de uma criança:
- Olá!
Ela enrubesceu, tinha certeza. Seu rosto deveria estar mais vermelho que seus cabelos.
- Oi... – disse timidamente.
- Você é... Bonita! – novamente aquele mesmo sorriso encantador.
Foi nesse ponto que seu coração parou. Um fato importante sobre meninas, é que elas entregam-se sem reservas, sem escrúpulos, sem medo. Ela soube que seria ele. Ela soube naquele instante que seu coração não voltaria a bater de tal forma por outro alguém.
E o tempo foi passando... E eles foram crescendo e apaixonando-se. O que antes era uma amizade passou a ser admiração e no fim transformou-se em amor. Ele era o melhor amigo dela... Era pra ele que ela corria pra contar que ganhara uma bicicleta nova e era ele quem ela abraçava chorando quando tirava uma nota baixa. Quanto a ele... Ela era tudo pra ele!
Quando tinham aproximadamente uns dez anos, seus pais construíram uma casa na árvore... Mas não uma dessas pequenas e normais. A casa era deles... Tinha um toque de cada um... Um pouquinho de ambos. Era o refúgio pra quando chovia e o abrigo pra quando brigavam. Mas porque, afinal, essa casa foi tão importante? Porque foi nela que ele disse pela primeira vez:
- Eu te amo minha ruivinha!
Como ele já esperava, ela corou fortemente e em seguida fez a única coisa que a fazia sentir-se melhor: O abraçou. Mas o que antes era um amor tão puro e doce, cultivado desde a infância, foi mudando com o tempo... Mais especificamente no colegial. Ele mudou... Ele conheceu novas pessoas e foi embora. Começou aos poucos, devagar. Ela foi sentindo lentamente ele escapar aos seus dedos... Ele foi seguindo sorrateiramente por um caminho que não tinha volta. Certa vez eles combinaram de encontrar-se na casa da árvore, logo depois da escola. Ela foi lá... Ele não. Passaram-se uma, duas, três horas e tudo o que ele fez foi mandar uma mensagem dizendo que não poderia ir. Ela chorou tanto... Gritou e soluçou com profunda tristeza enquanto a chuva caia com amargura na grama embaixo da casa. Ele passou a ignorá-la, mal a olhava nos olhos, e quando ela tentava falar com ele, tudo o que ele dizia era:
- Estou sem tempo!
Não demorou muito e as coisas mudaram drasticamente. Era uma tarde quente de primavera... Ela havia esquecido uma foto de infância na casa da árvore e voltou para pegá-la. Era uma foto simples: Paisagem tradicional de um parque, dois balanços e duas crianças sorridentes... Significava muito pra ela. Como desejava não ter voltado para buscar aquela foto. Assim que entrou na casa, deparou-se com uma das piores cenas que já vira: Ele estava lá... Com outra garota da escola. Qual foi a reação dela? Ela simplesmente perdeu o chão. Perdeu o melhor amigo e perdeu seu amor de uma única vez. Ela não soube o que fazer e ela não soube como agir naquele exato momento. Ela o via dia-a-dia com outra... Na escola, na vizinhança e na casa da árvore que um dia fora deles.
O tempo passou... Ela agora na faculdade cursando direito, e ele... Também. Foi difícil demais para ela encarar o que o destino julgou ser o certo, o engraçado: Encontrar ele lá. Ela respirou fundo, olhou dentro dos olhos dele e simplesmente seguiu o seu caminho... Não olhou para trás. Não tenho certeza sobre quem ficou mais surpreso, se ela por conseguir tirar forca de algum lugar dentro de si, ou se ele por ser completamente ignorado pela única garota que nunca pensou ser incapaz disso.
Ela estava orgulhosa de si própria... Havia conseguido “superar”, em partes, tudo aquilo que ele fez. Conseguiu superar todos os anos de amizade que ele jogou ao vento, e todas as brincadeiras que só eles conheciam. E nos dias em que chovia, o travesseiro transformava-se em sua única companhia capaz de suavizar suas lágrimas... Já que antes, era ele quem ela abraçava.
Ela cresceu e aquela garotinha virou mulher. Chegou o tão aguardado dia que passamos esperando por toda uma vida, aquele dia em que esperamos que nossos familiares e amigos próximos estejam lá nos prestigiando, e fazendo daquele momento único: O dia da formatura. E como tudo naquele dia era mágico, algo completamente inesperado aconteceu... Ele tomou coragem de encará-la após tanto tempo, e dirigiu-se até ela.
- Olá! – ele disse inseguro.
- Oi... – ela estava vermelha... Sabia disso.
- Você esta... Linda!
- Obrigada. – mas desta vez seu tom de voz mudou, ela não foi doce e gentil como sempre fora, ela foi fria.
- Podemos conversar?
- Eu espero que você seja feliz! É tudo o que eu tenho pra lhe dizer. – dizendo isto ela virou as costas, e dirigiu-se até seu refúgio, onde sua família a aguardava ansiosa. Não olhou pra traz, não disse uma só palavra, apenas uma lágrima rolou sobre sua face.
Ele tomado por uma crise de consciência, caiu em si, e viu tudo o que havia feito e o quanto havia magoado a única pessoa que realmente amou. Dirigiu-se até a casa da árvore... Havia tanto tempo que nenhum dos dois entrava lá. Já havia teias de aranha formando-se próximo a janela, e a porta já possuía o conhecido rangido. Na parede havia fotos dos dois, de um passado perfeito que ele havia jogado fora, e sobre a mesa havia uma carta. A carta estava datada de um ano atrás, próximo ao outono. A caligrafia dela ainda era a mesma que ele se lembrava, porém o papel já amarelado pelo tempo estava enrugado, o que pra ele só poderia significar uma coisa: Lágrimas. Sentou-se próximo a janela e começou a ler:
“Quando eu te conheci você era tudo pra mim e eu realmente o amava. Dói te ver hoje com alguém que não sou eu. Durante muito tempo você foi o único em quem confiei que me dediquei e que sinceramente achei que nunca me decepcionaria, mas você foi o único que me machucou.
Eu vou ser forte... Mas não me peça desculpas por algo imperdoável. Tenha de mim, apenas boas lembranças daquilo que um dia nós fomos. E saiba que se eu te encontrar no meu futuro, olharei para você com carinho lembrando-me do meu passado, mas não o irei querer no meu presente... Não me permitirei sofrer de novo. Siga a sua vida e seja feliz.
Eu sempre vou te amar... Hoje. Amanhã e Sempre!”
Naquele momento ele chorou tudo que um dia ela chorou, e percebeu que aquilo que ele tinha: Ela... Nunca mais voltaria.
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